quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Por Trás das Lentes - Aldo Lins

Canto
Mesmo sabendo que existem
Rimas passando fome
E versos sem casa para morar
Ainda assim eu canto
E canto como o solitário condor
Porque sei que um dia
Haverei de ver demolido o muro
Que se ergueu com a minha dor

Canto
Mesmo vendo um quadro negro no espelho
E um coração desenhado no peito
Com uma porta aberta para a saudade

Canto
Mesmo sentindo na boca
O gosto amargo que trago
Porque é neste canto
Que crio e formo
Este mundo louco, consciente
De poeta, de maluco impertinente
Que tanto canto sozinho
Como na multidão, no entanto encanto
Que no brilho ou no opaco deixo semente

Canto
E este canto alegre
Esconde este trapo
Porque é neste canto
Que eu sei que há em algum lugar
Num solitário canto
Um sabiá, um rouxinol
A murmurar também seu pranto

Canto
E este canto de guerra
Me ensina a viver em paz
Porque é neste canto
Que disfarço e encanto
E fujo do pranto
Por este ser acalanto

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Lançamento do Livro "Alma de Vidro" - Aldo Lins

Lançamento do livro "Alma de Vidro", de Aldo Lins
será dia 16 de Dezembro, ás 19h, no Teatro Mamulengo,
praça do Arsenal da Marinha -
Recife Antigo.

Paraibano, natural de Cajazeiras e
radicado há 17 anos em Recife,
o poeta Aldo Lins traz no livro
prefácio de Jaci Bezerra e orelha por Ângelo Monteiro.
A edição assinada pela Grupo Paés
vem para fazer sua poesia romper fronteiras.

domingo, 15 de novembro de 2009

Soluços do Derradeiro Canto - Aldo Lins

Sonhei voando entre catedrais e cemitérios
Pó cinza e a alma pomba azul no céu
Velas acessas sobre o mármore negro
Sentinelas agora sem forma e sem cor.

Rastejam vermes fieis companheiros
Famintos e sequiosos de uma carne fria
Na parede uma moldura desbotada
Onde já se vê gasta a juventude.

Um terno escuro para a solenidade
A posse nos termos do obituário,
E na gaveta murmura o triste diário.

A luz então se fragmenta no espaço
E o tempo que assistia a tudo agitado
Agora dorme silenciosamente sem asas.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Estigma - Aldo Lins

Estigma

"A minha alma é um grito.
E toda a minha obra é um comentário
sobre esse grito."
(Nikos Kazantzakis)

Acordei chorando
Jorrava de dentro de mim
Toda uma denúncia de tudo aquilo que sou.

Vagabundo, maluco, mendigo, moribundo,
anarquista, amante, poeta e sonhador.

Não me conheço,
Aliás, só por fotografia
Não sou lavoura nem edifício.
Sou um homem que passou fome
Escarrou sangue
E foi preso como anarquista.

Também não sei mais sorrir
A minha pele hoje
É uma tatuagem cheia de escamas.

Até o meu canário fugiu da garganta
Deixando minha alma de vidro
Perdida pelos escombros
Útero da solidão.

Meus trinta anos
O que direi a eles
Quando reinar o eclipse da despedida
Haverei de doar meus olhos
Para alguém poder te ver.

Pois quem sabe um dia
Eu, hóspede da utopia
Assustado com a sombra
Dos meus próprios sonhos
Seja encontrado sem vida
Sentado num cabaré vazio.

Pintura: Edmund Munch (O Grito)