quarta-feira, 4 de setembro de 2013
BALADA PARA JOHN LENNON
Antônio de Campos
As luzes de Nova Iorque ao apagar
de teu coração perderam a cor do filamento
Manhattan uma terra de lágrimas, agora
Mas o pássaro canta: ele apenas dorme
Muitas são as maneiras de se matar um homem,
a morte é que é uma só. Se difícil
madeira e cravos, fácil um buquê de balas.
Mas o pássaro canta ainda: ele apenas dorme.
Quatro balas quentes como a rosa
acesa de Hiroshima, quatro cordas partidas,
quatro punhaladas de chumbo.
Mas o pássaro canta ainda: ele apenas dorme
O inverno chegou mais frio
e a neve sobre o teu corpo é negra
como a pele dos que no Harlem te pranteiam.
Mas o pássaro canta ainda: ele apenas dorme.
Não mais verão teus olhos puros de criança,
parados num pedaço qualquer do céu da cidade
e com a infinita impossibilidade de chorar outra vez.
Mas o pássaro canta ainda: ele apenas dorme.
Por mim irias com aquele terno branco
e um punhado de vento em teus cabelos,
mas isso nada vale pra ressuscitar canções em tua boca.
Mas o pássaro canta mais alto que nunca: ele apenas dorme
SUBVERSIVA
Ferreira Gullar
A poesia
Quando chega
Não respeita nada.
Nem pai nem mãe
Quando ela chega
De qualquer de seus abismos
Desconhece o Estado e a Sociedade civil
Infringe o código de águas
Relincha
E só depois
Reconsidera: beija
Nos olhos os que ganham mal
Embala no colo
Os que têm sede de felicidade
E de Justiça.
E promete incendiar o país.
Porque cantamos - Mário Benedetti
Se estamos longe como um horizonte
se lá ficaram as árvores e céu
se cada noite é sempre alguma ausência
e cada despertar um desencontro
você perguntará por que cantamos
cantamos porque o grito só não basta
e já não basta o pranto nem a raiva
cantamos porque cremos nessa gente
e porque venceremos a derrota
cantamos porque o sol nos reconhece
e porque o campo cheira a primavera
e porque nesse talo e lá no fruto
cada pergunta tem a sua resposta
cantamos porque chove sobre o sulco
e somos militantes desta vida
e porque não podemos nem queremos
deixar que a canção se torne cinzas.
O ÚLTIMO RECURSO
Eu, como simples depoente
Eu, como simples depoente
Me nego a revelar os segredos da poesia
Em audiência preliminar.
Apenas posso expressar a verdade
Aos que estão no banco das testemunhas
Festejados poetas desta comarca.
Que as escrituras foram registradas
No livro das pequenas mágoas
Abandonos, decepções e saudades.
Transitado e julgado o conteúdo e a forma
Observada a jurisprudência do talento
E a legislação poética em vigor.
Solicito ao meritíssimo Senhor
Juiz das execuções líricas
O julgamento ao Tribunal dos leitores.
Em audiência preliminar.
Apenas posso expressar a verdade
Aos que estão no banco das testemunhas
Festejados poetas desta comarca.
Que as escrituras foram registradas
No livro das pequenas mágoas
Abandonos, decepções e saudades.
Transitado e julgado o conteúdo e a forma
Observada a jurisprudência do talento
E a legislação poética em vigor.
Solicito ao meritíssimo Senhor
Juiz das execuções líricas
O julgamento ao Tribunal dos leitores.
Aldo Lins
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